Minha Gravadora: Música Primeiro, Números Depois

Quanto o Spotify paga por 1 milhão de visualizações?

Por CAIO, 23 de setembro de 2024
A verdade sobre o Spotify - Minha Gravadora

Quanto o Spotify paga por 1 milhão de visualizações? Quer saber por que você nunca ganha dinheiro com o Spotify? Então leia este artigo e tenha insights indispensáveis para a sua carreira independente.

Recentemente solicitei um carro pelo aplicativo da Uber. O valor que eu costumava pagar para um trecho específico estava duas vezes mais caro.

Dei um grito de revolta  — “tudo nesse planeta é sobre tirar vantagem!”.

Dias antes, aceitei uma corrida com preço mais elevado, devido a uma necessidade, e o algoritmo nunca mais retornou o preço ao valor habitual.

Sem mais opções de deslocamento, visto que eu me localizava em uma região muito afastada de ônibus e metrô, havia alternativa senão me render ao valor superfaturado? Não. 

Do mesmo modo, nos tempos atuais, ser artista independente e tentar ignorar o Spotify é praticamente se “autossabotar”, muitos pensam e dizem.

Porém aqui vai uma pergunta: estamos calculando os custos reais para se estar na plataforma? Ela, verdadeiramente, é capaz de dar dinheiro ao artista independente?

Lembre-se: o Spotify é uma loja digital

Quando cursei publicidade e propaganda, uma das disciplinas que mais me chamou atenção foi a de trade marketing

Em linhas gerais, se trata de uma vertente do marketing preocupada em melhorar o desempenho das vendas de um produto em um ponto de venda, através de várias ações promocionais e visuais.

Nos supermercados, as gôndolas localizadas na altura dos olhos do cliente são as mais valiosas.

Acordos nos bastidores entre indústrias alimentícias e mercados definem o posicionamento de produtos nas lojas, por meio da taxa de gôndola, ou “slotting fee”.

Ou seja, o supermercado cobra mais caro das marcas para disponibilizar suas prateleiras mais estratégicas e melhor posicionadas.

Fazendo um paralelo com o Spotify, as playlists editoriais funcionariam como essas gôndolas. Quanto mais ouvintes uma playlist possuir, mais importante ela é.

A era das playlists

Não à toa, para medir o bom desempenho de um lançamento, o mercado musical nacional usa como referência as playlists Top 50 e Top 200 Spotify Brasil, por exemplo.

Nessas playlists são inseridas as canções que acumularam os maiores volumes de plays, desde o lançamento, em ordem decrescente.

Obviamente, é preciso um mínimo de reproduções diárias para entrar e se manter nessas playlists específicas.

Uma matéria de 2020 do site Popline apontava a necessidade de 200 mil plays diários, para se entrar na Top 50 Spotify Brasil. Desde então esses números só aumentam.

Ademais, o Spotify disponibiliza outras diversas playlists temáticas: de gêneros musicais variados, estilo de vida e cultura; há opções a perder de vista.

Os critérios do Spotify

Além de considerar o volume de plays, o Spotify adota critérios próprios para sua curadoria de playlists editoriais.

Os algoritmos da plataforma também criam playlists personalizadas para o ouvinte, baseadas em hábitos de consumo.

Mas no caso das editoriais, a prática comum para o processo de seleção das faixas é o pitch.

O pitch, bordão bastante presente na indústria musical, em linhas gerais, é a busca por espaço nas playlists. 

Distribuidoras e gravadoras, responsáveis por distribuir as músicas junto ao Spotify e demais plataformas de streaming, “vendem o peixe” dos lançamentos de seus artistas.

Por meio do portal Spotify for Artists, sendo administrador ou editor da conta, também é possível ao próprio artista realizar o pedido dentro do site.

Cabe ao Spotify decidir quais solicitações serão atendidas.

Qualidade não é fator decisivo

O Spotify exige certos parâmetros de qualidade para acolher uma música em sua plataforma.

Critérios técnicos e artísticos impactam a seleção, segundo a empresa. Qualidade seria um deles; porém é fator decisivo?

Partilhando um caso pessoal, para elucidar nosso diálogo, tive a feliz sorte de lançar um trabalho em parceria com a célebre Daniela Mercury.

O contato se deu por meio da distribuidora que trabalhamos em comum, a The Orchard — a cantora baiana me confessou preferir atuar de forma independente desde o início da carreira, apesar de ter vivido um período dentro de uma gravadora.

Pois bem. O nome dela e sua trajetória, por si só, dispensam comentários. A produção musical ficou a cargo do Douglas Moda, um dos grandes nomes contemporâneos da produção (assina trabalhos para IZA, Luísa Sonza, Jão, Emicida e tantos mais).

Juntamos diversos amigos e parceiros para viabilizar um videoclipe potente para a faixa Sente o Tambor [Corpo Blindado].

Mesmo com inúmeras matérias na imprensa pautando o lançamento, não conseguimos entrar em uma única playlist editorial sequer do Spotify.

A exemplo dessa situação particular, milhares de artistas independentes passam diariamente pela mesma situação e se frustram.

Embora atendendo, aparentemente, a diversos critérios, isso não é garantia de você ser notado na fila da curadoria.

Mas tantos outros são. O que define essa escolha

Passei a me questionar.

Daí a reflexão: se um supermercado, como mencionado anteriormente, cobra uma taxa das marcas para disponibilizar suas melhores gôndolas, a curadoria dessas playlists ocorreria totalmente “de graça” ?

A história do Spotify

Em resumo, o Spotify nasceu como uma maneira de disponibilizar músicas online para o público, que em meados dos anos 2000, tinha poucas opções de consumo nesse formato.

O download era mais comum e as gravadoras tentavam combater a pirataria advinda com a internet — a venda dos discos físicos, responsável pela maior parcela de faturamento das gigantes da música, entrava em declínio.

Daniel-EK, empreendedor sueco do ramo da tecnologia, enxergou uma boa oportunidade: ele, que perseguia fortuna desde muito jovem, havia tentado lançar vários negócios.

Teve êxito em uma empresa de anúncios online (a Advertigo) e a vendeu em 2006 para outra companhia Sueca, a Tradedoubler.

Todavia foi no serviço de streaming de música que ele percebeu uma chance decisiva de mudar o rumo da história do music business — e do próprio bolso.

Inspirado no site sueco Pirate Bay, que propunha o compartilhamento de arquivos entre usuários (à época considerado um grave incentivo criminoso à pirataria), Daniel juntou um time de programadores, sócios e investidores para criar a sua própria versão do site em questão.

Em 2008, o Spotify iniciava as suas operações, inclusive, utilizando arquivos MP3 piratas — ou seja, sem a autorização das gravadoras, donas dos fonogramas.

O sucesso do negócio, que crescia exponencialmente, dependia da autorização legal delas.

Após muitos embates, conforme expôs a minissérie docu-ficcional “Som Na Faixa”, disponível na Netflix, só havia uma solução possível: as gravadoras se tornarem sócias da plataforma.

Jogo de interesses

Sony, Universal e Warner Music se tornaram acionistas do Spotify, em troca do licenciamento de seus fonogramas, há anos atrás.

A Warner vendeu suas ações em 2018, contudo as demais seguem dentro da plataforma influenciando nas diretrizes comerciais.

Há ferramentas exclusivas para gravadoras, a exemplo do ‘Discovery Mode’, cujo objetivo é o de disponibilizar às equipes dos mega artistas o recurso de recomendação de músicas aos usuários, dentro do aplicativo.

A curadoria de playlists, recomendações de lançamentos, capas de destaque das playlists, tudo isso passa pelo filtro de interesse comercial fortemente influenciado pelas gravadoras.

Independente, mas nem tanto

O Spotify informou faturamento recorde arrecadado pelos artistas independentes em 2023, praticamente empatando com o montante advindo dos artistas de gravadoras.

Em contrapartida, a Sony Music tem divulgado cada vez mais a aquisição de distribuidoras independentes — junto com todo o catálogo de artistas, que passam a estar indiretamente ligados à gravadora.

Recentemente, por exemplo, a multinacional divulgou à imprensa a compra da Altafonte Brasil, além da gravadora Som Livre.

Com base nesse cenário, você consegue medir as chances de um bom desempenho para um artista independente autônomo dentro do Spotify?

Não é de hoje que o jogo funciona assim

Adelzon Alves, importante radialista e estudioso da música popular brasileira, em entrevista para o Brito Podcast, no começo de 2024, relatou um fato curioso sobre as gravadoras na década de 60.

Com o falecimento de grandes artistas internacionais hitmakers àquela época, uma solução encontrada para não comprometer a arrecadação dos royalties e faturamento das gravadoras foi começar a lançar versões brasileiras de músicas gringas consagradas.

A ordem das gravadoras para as rádios era expressa: favorecer as canções que se encaixavam nesse perfil. Enquanto isso, trabalhos originais de Dorival Caymmi, Elza Soares, Cartola e tantos outros não eram executados, relatou o radialista

Indícios de fraude sobre o quanto o Spotify paga por 1 milhão de visualizações

Frequentemente surgem notícias que expõem práticas fraudulentas dentro do Spotify, o que afeta diretamente os resultados do artista independente.

Matéria divulgada pelo portal Metrópoles em março de 2024 expôs relatos de personalidades da indústria musical brasileira, detalhando a ação de artistas de grandes gravadoras dentro do Spotify.

Chega-se a pagar cerca de R$ 50 mil para alcançar 1 milhão de streams, ou seja, reproduções de uma música, e R$ 200 mil para manter a faixa no topo das playlists.

O feito é possível devido ao uso de bots (robôs) que aumentam artificialmente a quantidade de reproduções. Os termos de serviço da plataforma condenam essa prática, mas ela parece mais comum do que imaginamos.

Recentemente, um produtor musical americano foi preso, acusado de fraude no Spotify e demais plataformas de streaming.

Após criar milhares de bandas e músicas usando inteligência artificial, Michael Smith, de 52 anos, utilizava robôs para executar as músicas mais de 660 mil vezes ao dia.

Com o esquema fraudulento ele teria arrecadado U$ 10 milhões.

Toma lá da cá

Em 2017, o portal Music Business Worldwide divulgou uma análise em que alegava que o Spotify adicionava “artistas fantasmas” em playlists para reduzir o repasse de royalties.

Como exemplo, citaram no artigo o caso de um suposto artista que acumulava 4,5 milhões de reproduções, com menos de 5 meses de existência — nenhum perfil do tal cantor foi encontrado em outras redes sociais. Se o Spotify paga por 1 milhão de visualizações, no mínimo, a cada artista “fantasma” desse, isso dilui o valor de royalties distribuído aos demais.

A plataforma de serviços de streaming negou veementemente tal afirmação, alegando se tratar de uma mentira categórica.

Enquanto empresa de capital aberto, uma das maiores preocupações do Spotify é entregar lucro aos seus acionistas.

A multinacional informou lucro líquido de 197 milhões de euros no 1 ° trimestre de 2024, uma recuperação ante ao prejuízo de 226 milhões de euros em período similar em 2023.

Podemos concluir algo? Não. Sem provas, sem certezas. Todavia podemos nos questionar o seguinte:

A fraude de streaming para a indústria musical seria algo novo e utilizado somente agora?

Recorde atrás de recorde

Ao avaliarmos os maiores lançamentos de música no Spotify Brasil, é notável que se trata, em quase 100% dos casos, de artistas de gravadoras (coincidentemente, daquelas que são sócias da plataforma).

Vejamos os últimos recordes das primeiras 24 horas de álbuns lançados, de acordo com o portal G1:

  • 5° Lugar: Jão – “Super” 8.118.335 reproduções (Universal Music)
  • 4° Lugar: Anitta – “Funk Generation” 10.783.158 reproduções (Universal Music Group)
  • 3° Lugar: Taylor Swift – “The Tortured Poets Department” 11.836.644 reproduções (Universal Music Group)
  • 2° Lugar: Luísa Sonza – “Escândalo Íntimo” 15.638.798 reproduções (Sony Music)
  • 1° Lugar: Matuê – “333” 16.018.541 reproduções (atualmente independente, após longo contrato com a Sony Music)

Quanto o Spotify paga por 1 milhão de visualizações a cada artista desses? Com certeza, bem mais do que um artista independente pequeno é capaz de receber em um ano inteiro.

E na cena independente de mais destaque?

Há algumas semanas, a multiartista Liniker lançou seu aguardado segundo álbum solo, o excelente “Caju”, distribuído pela Altafonte (que já sabemos quem comprou).

O talento da cantora é inegável. Somando isso às estratégias de distribuição (e investimento) do selo espanhol “independente”, ela alcançou o melhor lançamento de sua carreira.

Foram 6 milhões de reproduções, apenas nas primeiras 24 horas. Atualmente o disco acumula mais de 30 milhões de plays.

Marketing é ilusionismo

Os frequentes e-mails enviados pelo Spotify à sua base de artistas costumam reforçar as melhores estratégias para o alcance de bons resultados na plataforma.

A empresa revisa constantemente seus termos de serviço, condenando qualquer prática fraudulenta que provoque resultados artificiais.

Diante de todas as questões apontadas e os recorrentes resultados mostrados nas playlists, qual garantia temos de que a curadoria de músicas não é tendenciosa para determinados interesses comerciais?

Nenhuma. 

Afinal de contas, enquanto empresa privada, o interesse de qualquer negócio é o mesmo: lucro.

O excelente marketing da plataforma nos causa a impressão de que alcançar o topo das playlists, ou mesmo ter músicas incluídas nelas, gerar milhões de plays e ganhar dinheiro, seria algo fácil e simples.

O pior de tudo, nos induz a pensar que tais conquistas são mérito, que dependem totalmente de nossos esforços. Não é bem assim.

“Quanto o Spotify paga por 1 milhão de visualizações” seria realmente a pergunta certa a se fazer para tentar viver da sua música de forma justa?

Conclusão

Há muitos outros tópicos a serem abordados, mas deixarei para um próximo artigo.

Absorver informação de qualidade e dominar todos os processos de uma carreira independente são a única maneira eficaz para se viver de música, sem depender de viralizar no Spotify ou nas redes sociais.

Eu sugiro carinhosamente que você conheça a jornada online “Minha Gravadora: Música Primeiro, Números Depois”, porque é uma forma de aprender ferramentas valiosas e obter insights indispensáveis para viver da sua arte de forma autossuficiente.

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Quero aprender a ter uma carreira musical sem viralizar nas redes

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No mais, não se culpe pelos resultados que não dependem de você. Descubra novas formas de fazer as mesmas coisas. É libertador, acredite. 

Quanto o Spotify paga por 1 milhão de visualizações não é tão relevante, quando você entende que ele não foi planejado para que você, artista independente, ganhe dinheiro (de verdade). Por isso eu considero essa plataforma mais como um site de divulgação, não de geração de renda.

Ficou com alguma dúvida? Deixe um comentário! 😉

Perguntas Frequentes sobre quanto o Spotify paga por 1 milhão de visualizações:

Para entrar em uma playlist editorial do Spotify, basta ter uma música de qualidade?

Não. A plataforma usa critérios próprios para escolher as músicas que entrarão nas playlists, mas eles não se limitam apenas à qualidade artística. Interesses comerciais também fazem parte das estratégias.

O Spotify é uma empresa exclusiva para artistas independentes?

Não. Ele é uma plataforma de serviços de streaming de música, sendo a principal empresa do segmento atualmente (detém 30% do mercado). O Spotify, inclusive, possui como sócias as gravadoras Sony Music e Universal Music.

O que é pitch de lançamento?

É o contato com o Spotify e demais plataformas de streaming para tentar incluir o lançamento de uma música em playlists editoriais. Geralmente é realizado pelas distribuidoras e gravadoras, mas o artista independente pode solicitar o pedido, no caso do Spotify, diretamente no portal Spotify for Artists, tendo perfil de editor ou administrador.

O Spotify paga bem para o artista independente?

Depende. Como a arrecadação de royalties está associada à quantia de reproduções, é necessário alcançar plays milionários para se ter uma renda minimamente satisfatória. O ideal é não contar apenas com essa alternativa financeira, se você é um artista pequeno.

Como entrar no topo das playlists Top 50 e Top 200 Spotify Brasil?

Sendo honesto, basicamente pagando por tráfego, ou tendo uma grande base de ouvintes. O Spotify disponibiliza o Marquee, por exemplo, ferramenta de recomendação patrocinada de lançamentos para os usuários. Contudo é necessário atender a critérios mínimos exigidos pela plataforma. Além do mais, há relatos no mercado de grandes artistas vinculados a gravadoras que contratam reproduções automatizadas, chegando a pagar até R$ 200 mil para atingir 4 milhões de reproduções — prática proibida pelos termos de serviço do Spotify.

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